sábado, 7 de janeiro de 2012

Adieu 2011!



2011 se foi. Foi um ano bastante intenso, não apenas para mim mas para o mundo inteiro. Aqui, no Japão, foi um ano de aceitação e recuperação. A cada ano, a fundação que administra o Exame de Aptidão em Ideogramas (Kanji kentei ou, abreviadamente, Kanken, 漢検) faz uma votação aberta para selecionar um ideograma (kanji) que represente o ano do país. Em 2011, o ideograma escolhido foi 絆 (kizuna), que significa "ligação", "conexão"; uma demonstração de que, num ano de perdas e desgraças, a ligação entre seres humanos - responsável pela reconstrução de vidas destruídas - é a que se sobressai. Muitas vezes falamos que japoneses são pessoas frias, mas nesses momentos trágicos enxergamos a compaixão e a sabedoria em reconhecer que não é possível ser plenamente feliz se existem tantas outras pessoas sofrendo. Todos somos um país só, e somos todos igualmente responsáveis por esse país. Isso é kizuna.

Outro fenômeno curioso em 2011, refletido no espírito de kizuna, é que após a tragédia de março, o número de casamentos aumentou, e também o número de divórcios (cerca de 300% (!)). As pessoas perceberam o quão preciosa e frágil é a vida, e como ela pode acabar em fração de segundos sem prévio aviso. Como resultado, muitos resolveram que não deviam mais perder tempo e deveriam correr atrás da felicidade, enquanto ainda há tempo. Muitas ligações foram formadas, e muitas também rompidas.


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Fim de ano no Japão significa sentir frio. O Inverno chega com força no fim de dezembro e se arrasta até meados de março, quando vem a Primavera. Gastei uma boa parte da bolsa para comprar roupas de frio. Aliás, nunca havia gastado tanto numa única roupa: um sobretudo que parece um futon, que custou o equivalente a 160 reais (pechincha!), um tênis impermeável com camada termoisolante de 100 reais e mais uns 200 reais em roupas de frio, além de luvas, gorros e um aquecedor pro quarto. Pois é, inverno é caro.


O Natal desse ano foi especialmente diferente. Inicialmente, eu iria passar a ceia com meus amigos do koshukai (o B2011), em um hotel na cidade de Nikko; um evento que os bolsistas tradicionalmente fazem todo ano ("Natal de Nikko"). Porém, acabou surgindo o convite para ir para Tohno (uma cidade na província de Iwate, norte de Miyagi) e participar de um projeto chamado "100 papais noéis". Acabei decidindo ir pra lá com meu amigo malasiano (Loh), uma amiga nossa romena (Cecilia), uma garota do Camboja e dois japoneses, que o Loh conheceu em sua última missão pelo Gakuvo. Dessa vez fomos por nossa própria conta e risco: compramos as passagens de ônibus e trens e fomos.

Chegamos em Tohno na manhã do dia 24: ainda estava escuro, havia nevado a noite inteira e as ruas estavam cobertas de uma camada fina (e escorregadia) de gelo e alguns pequenos amontoados de neve. Fazia frio, mas não tanto quanto eu estava esperando. Fizemos nosso "check in" no centro de voluntários (Magokoro net), deixamos as malas num micro-espaço, comemos nosso café-da-manhã que trouxemos de Tokyo, vestimos nossas roupas de papai-noel e fomos para a fila de gente que esperava para ir trabalhar. Tudo era bastante organizado, os papais noéis foram divididos em grupos: um para cada cidade da costa. Nosso grupo foi para a vila de Ootsuchi (大槌町). Nessa vila, que hoje tem pouco mais de 12.000 habitantes, 777  pessoas morreram, 952 estão desaparecidas e mais de 9000 estavam desabrigadas no mês seguinte ao tsunami. No dia 22 de dezembro, dois dias antes de chegarmos, um shopping center com supermercado e uma quadra de compras foram inauguradas no local. Antes disso, os moradores tinham que ir de carro até a cidade mais próxima (20 ~ 30 minutos) para fazer suas compras ou comer fora. Nossa missão era distribuir os milhares de presentes comprados através de doações do Japão e do mundo inteiro. Várias caixas de presentes para os adultos continham escritos de "boa sorte!", "vocês são heróis!", "não desistam!!" e mensagens do tipo em diversas línguas.  Trabalhamos lá no sábado, dia 24, e no domingo, dia 25.

 Papai-noelzada se organizando em times.

Ho Ho Ho Ho! Da esquerda pra direita: Loh, Mae-kun, Cecilia, eu, Yee-chan (embaixo), Kei-kun.

 Nosso local de trabalho no primeiro dia. Primeiros moradores começando a chegar.

 Manhã do dia 25. Nevou a noite toda e estava mais frio que dia 24, mas o Sol brilhava forte. 


Papais noéis magrelos! Vento batendo forte e nossas barbas voando.

Voltamos para Tokyo na noite do dia 26. Durante o dia, fomos para as casas temporárias na cidade de Rikuzentakata (陸前高田市), onde Loh e os outros haviam trabalhado na última missão, em novembro. Fomos lá para oferecer chá e oden (um tipo de sopa daqui, típica do inverno), e ashiyu (足湯, massagem no pés e mãos com água quente) para os moradores. A grande maioria das pessoas que moram lá são velhinhos e velhinhas; como é, aliás, a maioria da população do Japão. Tivemos oportunidade de conversar com eles (ou tentar, porque entender seu sotaque pesado é difícil!) e ouvir várias histórias. Foi realmente uma experiência muito boa! No fim das contas, acabamos distribuindo todo o oden, meias de frio, mandarinas e pequenos presentinhos que trouxemos de Tokyo para todos os moradores.

 Yee-chan servindo Oden.

 Loh e eu ouvindo e tentando conversar com as senhorinhas que esperavam pelas massagens.

Ganhamos até comida feita a mão pelas moradoras dali! Um bolinho de moti recheado com amêndoas e vegetais em conserva (pickles), deliciosos!! 

Na hora de voltar, mesmo com um frio cortante, essa senhora fez questão de nos acompanhar até a entrada das casas e ficar ali conosco até irmos embora! ^^

No fim da tarde, voltamos para o alojamento de voluntários, pegamos nossas coisas e fomos embora. Jantamos perto da estação de Tohno, pegamos o trem até Kitakami (depois de um gélido norikae em Sakuramaki), e de lá pegamos ônibus de volta para Tokyo. Nevou bastante em Kitakami, então pudemos nos divertir um pouco com a neve antes de voltar para Tokyo. =)
 Brincando de katana com uma das estalactites de gelo enormes que se formaram na vidraça da estação.




 Hashi de gelo! :D

E, enquanto brincávamos e esperávamos o ônibus, a neve caía...


Ho Ho Ho! Feliz Natal!!! :))


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A passagem de ano foi comemorada com os brasileiros (e o Kenji, que já é praticamente brasileiro a essa altura do campeonato) no dormitório de Komaba, onde a Tiaki e o João moram. Fizemos uma senhora compra num mercado brasileiro online, e tivemos uma ceia farta, com lentilha, picanha, cupim, coxinha, bolinho de bacalhau, bolinha de queijo, empadinha e salada! E, numa mistureba cultural, toshikoshi soba (macarrão soba de passagem de ano), ozoni (uma sopa em que cada ingrediente representa uma característica a ser desenvolvida ao longo do ano), e mazamorra morada (um tipo de doce peruano, que aprendi a fazer com a Patty e a Verónica, lá na USP) de sobremesa! Ah e, claro, Guaraná!


 Com direito a Pikachu!! Esse era o (pseudo-) ozoni. Moti, kamaboko e umas ervas japonesas, tudo com seu significado.


Após a ceia, fomos para o Zojoji, templo budista perto da Tokyo Tower, para assistir uma cerimônia em que eles soltam centenas de balões no ar e ouvir as 108 batidas do grande sino. Mas, como atrasamos demais com a ceia (Brasileiros...), acabamos nos atrasando e passando a virada do ano no caminho pro templo, na plataforma de embarque do metrô durante o norikae. Dizem que o que você faz durante a virada do ano se repetirá pelo ano inteiro. Pois então, vamos pegar muitos trens esse ano! :(


Esperando o trem chegar, à 0:01.

Feliz Ano Novo!! Encontramos brasileiros na plataforma também (olha a coincidência!) e pedimos para eles tirarem uma foto nossa. Hehe :)

Primeira visão de Tokyo em 2012, ao sair da estação. Tokyo Tower! :)

Chegando no templo, uma fila enorme de gente. Tinha uma fogueira enorme, bandeirinhas coloridas, balões e várias barraquinhas vendendo comidas e coisas de simpatia pro ano novo. Com o frio que tava fazendo, era como se estivéssemos numa festa junina.

Assistimos um pouco de uma missa. (Obs.: O abade estava usando um chapéu que me fez lembrar de imediato o Chaves.) 

Saindo do templo, fomos a um santuariozinho xintoísta (ainda dentro do precinto do templo), jogamos umas moedinhas e rezamos por um bom ano. 

O grande sino. Na virada do ano eles tocam 108 vezes, numa referência à filosofia budista de que somos acometidos por 108 corrupções que temos que eliminar de nossas vidas. 

 2812?? Zero FAIL!

 Sim, o templo estava lotado de gente e muitos estrangeiros! 




E que venha um bom 2012 para todos nós! 明けましておめでとうございます!
:)

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