quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Voluntariando em Tohoku

Já postei sobre o trabalho voluntário aqui várias vezes. Foi uma das principais experiências que tive aqui no Japão até então (embora seja bastante difícil rankear todas as milhares de novas experiências que tive por aqui desde que cheguei).

O Pedro preparou, com muita paciência e dedicação, um vídeo divulgando um pouco do que vivenciamos nessas viagens, para divulgar ao pessoal do B2012 no Koshukai desse ano. Segue:




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PS.: Ignorem nossas caras mongas e a exímia desenvoltura na frente da câmera =P

sábado, 7 de janeiro de 2012

Adieu 2011!



2011 se foi. Foi um ano bastante intenso, não apenas para mim mas para o mundo inteiro. Aqui, no Japão, foi um ano de aceitação e recuperação. A cada ano, a fundação que administra o Exame de Aptidão em Ideogramas (Kanji kentei ou, abreviadamente, Kanken, 漢検) faz uma votação aberta para selecionar um ideograma (kanji) que represente o ano do país. Em 2011, o ideograma escolhido foi 絆 (kizuna), que significa "ligação", "conexão"; uma demonstração de que, num ano de perdas e desgraças, a ligação entre seres humanos - responsável pela reconstrução de vidas destruídas - é a que se sobressai. Muitas vezes falamos que japoneses são pessoas frias, mas nesses momentos trágicos enxergamos a compaixão e a sabedoria em reconhecer que não é possível ser plenamente feliz se existem tantas outras pessoas sofrendo. Todos somos um país só, e somos todos igualmente responsáveis por esse país. Isso é kizuna.

Outro fenômeno curioso em 2011, refletido no espírito de kizuna, é que após a tragédia de março, o número de casamentos aumentou, e também o número de divórcios (cerca de 300% (!)). As pessoas perceberam o quão preciosa e frágil é a vida, e como ela pode acabar em fração de segundos sem prévio aviso. Como resultado, muitos resolveram que não deviam mais perder tempo e deveriam correr atrás da felicidade, enquanto ainda há tempo. Muitas ligações foram formadas, e muitas também rompidas.


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Fim de ano no Japão significa sentir frio. O Inverno chega com força no fim de dezembro e se arrasta até meados de março, quando vem a Primavera. Gastei uma boa parte da bolsa para comprar roupas de frio. Aliás, nunca havia gastado tanto numa única roupa: um sobretudo que parece um futon, que custou o equivalente a 160 reais (pechincha!), um tênis impermeável com camada termoisolante de 100 reais e mais uns 200 reais em roupas de frio, além de luvas, gorros e um aquecedor pro quarto. Pois é, inverno é caro.


O Natal desse ano foi especialmente diferente. Inicialmente, eu iria passar a ceia com meus amigos do koshukai (o B2011), em um hotel na cidade de Nikko; um evento que os bolsistas tradicionalmente fazem todo ano ("Natal de Nikko"). Porém, acabou surgindo o convite para ir para Tohno (uma cidade na província de Iwate, norte de Miyagi) e participar de um projeto chamado "100 papais noéis". Acabei decidindo ir pra lá com meu amigo malasiano (Loh), uma amiga nossa romena (Cecilia), uma garota do Camboja e dois japoneses, que o Loh conheceu em sua última missão pelo Gakuvo. Dessa vez fomos por nossa própria conta e risco: compramos as passagens de ônibus e trens e fomos.

Chegamos em Tohno na manhã do dia 24: ainda estava escuro, havia nevado a noite inteira e as ruas estavam cobertas de uma camada fina (e escorregadia) de gelo e alguns pequenos amontoados de neve. Fazia frio, mas não tanto quanto eu estava esperando. Fizemos nosso "check in" no centro de voluntários (Magokoro net), deixamos as malas num micro-espaço, comemos nosso café-da-manhã que trouxemos de Tokyo, vestimos nossas roupas de papai-noel e fomos para a fila de gente que esperava para ir trabalhar. Tudo era bastante organizado, os papais noéis foram divididos em grupos: um para cada cidade da costa. Nosso grupo foi para a vila de Ootsuchi (大槌町). Nessa vila, que hoje tem pouco mais de 12.000 habitantes, 777  pessoas morreram, 952 estão desaparecidas e mais de 9000 estavam desabrigadas no mês seguinte ao tsunami. No dia 22 de dezembro, dois dias antes de chegarmos, um shopping center com supermercado e uma quadra de compras foram inauguradas no local. Antes disso, os moradores tinham que ir de carro até a cidade mais próxima (20 ~ 30 minutos) para fazer suas compras ou comer fora. Nossa missão era distribuir os milhares de presentes comprados através de doações do Japão e do mundo inteiro. Várias caixas de presentes para os adultos continham escritos de "boa sorte!", "vocês são heróis!", "não desistam!!" e mensagens do tipo em diversas línguas.  Trabalhamos lá no sábado, dia 24, e no domingo, dia 25.

 Papai-noelzada se organizando em times.

Ho Ho Ho Ho! Da esquerda pra direita: Loh, Mae-kun, Cecilia, eu, Yee-chan (embaixo), Kei-kun.

 Nosso local de trabalho no primeiro dia. Primeiros moradores começando a chegar.

 Manhã do dia 25. Nevou a noite toda e estava mais frio que dia 24, mas o Sol brilhava forte. 


Papais noéis magrelos! Vento batendo forte e nossas barbas voando.

Voltamos para Tokyo na noite do dia 26. Durante o dia, fomos para as casas temporárias na cidade de Rikuzentakata (陸前高田市), onde Loh e os outros haviam trabalhado na última missão, em novembro. Fomos lá para oferecer chá e oden (um tipo de sopa daqui, típica do inverno), e ashiyu (足湯, massagem no pés e mãos com água quente) para os moradores. A grande maioria das pessoas que moram lá são velhinhos e velhinhas; como é, aliás, a maioria da população do Japão. Tivemos oportunidade de conversar com eles (ou tentar, porque entender seu sotaque pesado é difícil!) e ouvir várias histórias. Foi realmente uma experiência muito boa! No fim das contas, acabamos distribuindo todo o oden, meias de frio, mandarinas e pequenos presentinhos que trouxemos de Tokyo para todos os moradores.

 Yee-chan servindo Oden.

 Loh e eu ouvindo e tentando conversar com as senhorinhas que esperavam pelas massagens.

Ganhamos até comida feita a mão pelas moradoras dali! Um bolinho de moti recheado com amêndoas e vegetais em conserva (pickles), deliciosos!! 

Na hora de voltar, mesmo com um frio cortante, essa senhora fez questão de nos acompanhar até a entrada das casas e ficar ali conosco até irmos embora! ^^

No fim da tarde, voltamos para o alojamento de voluntários, pegamos nossas coisas e fomos embora. Jantamos perto da estação de Tohno, pegamos o trem até Kitakami (depois de um gélido norikae em Sakuramaki), e de lá pegamos ônibus de volta para Tokyo. Nevou bastante em Kitakami, então pudemos nos divertir um pouco com a neve antes de voltar para Tokyo. =)
 Brincando de katana com uma das estalactites de gelo enormes que se formaram na vidraça da estação.




 Hashi de gelo! :D

E, enquanto brincávamos e esperávamos o ônibus, a neve caía...


Ho Ho Ho! Feliz Natal!!! :))


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A passagem de ano foi comemorada com os brasileiros (e o Kenji, que já é praticamente brasileiro a essa altura do campeonato) no dormitório de Komaba, onde a Tiaki e o João moram. Fizemos uma senhora compra num mercado brasileiro online, e tivemos uma ceia farta, com lentilha, picanha, cupim, coxinha, bolinho de bacalhau, bolinha de queijo, empadinha e salada! E, numa mistureba cultural, toshikoshi soba (macarrão soba de passagem de ano), ozoni (uma sopa em que cada ingrediente representa uma característica a ser desenvolvida ao longo do ano), e mazamorra morada (um tipo de doce peruano, que aprendi a fazer com a Patty e a Verónica, lá na USP) de sobremesa! Ah e, claro, Guaraná!


 Com direito a Pikachu!! Esse era o (pseudo-) ozoni. Moti, kamaboko e umas ervas japonesas, tudo com seu significado.


Após a ceia, fomos para o Zojoji, templo budista perto da Tokyo Tower, para assistir uma cerimônia em que eles soltam centenas de balões no ar e ouvir as 108 batidas do grande sino. Mas, como atrasamos demais com a ceia (Brasileiros...), acabamos nos atrasando e passando a virada do ano no caminho pro templo, na plataforma de embarque do metrô durante o norikae. Dizem que o que você faz durante a virada do ano se repetirá pelo ano inteiro. Pois então, vamos pegar muitos trens esse ano! :(


Esperando o trem chegar, à 0:01.

Feliz Ano Novo!! Encontramos brasileiros na plataforma também (olha a coincidência!) e pedimos para eles tirarem uma foto nossa. Hehe :)

Primeira visão de Tokyo em 2012, ao sair da estação. Tokyo Tower! :)

Chegando no templo, uma fila enorme de gente. Tinha uma fogueira enorme, bandeirinhas coloridas, balões e várias barraquinhas vendendo comidas e coisas de simpatia pro ano novo. Com o frio que tava fazendo, era como se estivéssemos numa festa junina.

Assistimos um pouco de uma missa. (Obs.: O abade estava usando um chapéu que me fez lembrar de imediato o Chaves.) 

Saindo do templo, fomos a um santuariozinho xintoísta (ainda dentro do precinto do templo), jogamos umas moedinhas e rezamos por um bom ano. 

O grande sino. Na virada do ano eles tocam 108 vezes, numa referência à filosofia budista de que somos acometidos por 108 corrupções que temos que eliminar de nossas vidas. 

 2812?? Zero FAIL!

 Sim, o templo estava lotado de gente e muitos estrangeiros! 




E que venha um bom 2012 para todos nós! 明けましておめでとうございます!
:)